Antonio de Albuquerque
Sorrindo de alegria, num espaço sublime entre contos, encantos e poesias.
Capa Meu Diário Textos Áudios E-books Fotos Perfil Prêmios Livro de Visitas Contato Links
Sonho Guerreiro
Capítulo III 

1 Bezerra é meu bom conselheiro, um dia falarei com ele pedindo orientação relativo ao meu pensamento de ir para o Amazonas. Linhares falava para si, lembrando que Padre Paulino havia afirmado no sermão da igreja que poucos retirantes vindos para o Amazonas, enriqueceram, muitos morreram vítimas de doenças tropicais; malária, febre amarela, mordidas de répteis, até de tocaia, por parte de alguns seringalistas. Os migrantes ou brabos, como foram denominados, enfrentaram grandes adversidades e questões socioculturais, resultante de um modo de vida, diferente, próprio da região.

2 O migrante era chamado brabo, por desconhecer a complexidade da floresta, uma realidade que lhe era imposta em tudo por tudo; a densa floresta, o uso da canoa, rios, animais ferozes, tribos indígenas e doenças tropicais. Eram esses, os grandes desafios para o seringueiro, mas o maior deles eram os seringalistas, que faziam suas próprias Leis, escravizando os seringueiros, entretanto, vale ressaltar a existência de seringalistas honrados e justos. Para ser manso e conhecedor da floresta, o seringueiro precisava aprender a usar a canoa, pescar, navegar, caçar, descobrir os frutos da floresta e quais poderia consumir como alimento, ou medicamento natural, conhecer animais e seus hábitos, e como poderia captura-los. Descobrir a serventia das plantas medicinais, visto que os remédios tradicionais não estavam ao seu alcance.

3 Manso, não significava tão somente, obter o conhecimento e a adaptação à floresta, mas também de sujeição absoluta ao seringalista. Quando cessavam os recursos, o migrante não voltava para sua terra natal, tornava-se submisso ao patrão. Devendo, era escravizado pelo resto da vida, em decorrência de sua miserável condição de abandono. As autoridades do Governo viviam nababescamente no Rio de Janeiro, capital da Republica ou Manaus, onde moravam em casas luxuosos, frequentando cabarés, óperas e teatros. A reflexão sobre essas mazelas deixava Linhares temeroso, sem poder expor seu sonho a família, ele pensava em ir para o Amazonas, não para ser escravo, como já o era pelo mandonismo do patrão, coronel Bento. Mesmo sem grande riqueza, queria obter melhor qualidade de vida, saindo da pobreza, sem as amarras de patrão nenhum. Queria plantar sua lavoura numa terra que fosse sua e que, ao morrer, pudesse deixar para a família. Temeroso de tornar o sonho irrealizável, pacientemente esperava o momento certo para comunicar à família o plano de emancipação. Um grito de liberdade, um sonho guerreiro.

4 Data do padroeiro da cidade, Linhares estava presente. Nesse dia se confessou e comungou. Depois da missa bebeu uns tragos de cachaça e corajosamente consultou o dr. Bezerra. Não poderia existir dia melhor para expor o seu projeto ao amigo e confidente. Bezerra pacientemente escutou o amigo expor seu projeto — É arriscado, mas o que fazer! Se você ficar aqui, vai terminar a vida como tantos outros, morrendo na indigência, e os meninos jamais frequentarão a escola. Se fosse eu mais jovem, iria junto, disse Bezerra. Com os olhos rasos d’água, Linhares agradeceu as palavras de incentivo e, com determinação e alegria, despediu-se do amigo.

5 Após alguns dias reuniu a família, falou sobre o projeto, e descobriu ser o que mais Augusta queria, embora ela houvesse guardado somente para si o sonho de mulher guerreira. Passaram-se dois meses. Linhares vendeu dois jumentos, algumas galinhas, um galo, dois porcos, e até um tatu que seria a ceia do Natal. Não negociou as enxadas, por serem um sagrado instrumento de trabalho. Doutor Bezerra e padre Paulino emprestaram um tiquinho de dinheiro e fizeram mil recomendações. — Um dia voltarei para pagar, disse Linhares. — O melhor pagamento é saber que você se deu bem! — disse o médico. — Que Deus o abençoe e volte rico para auxiliar o povo dessa terra sofrida! — Disse o padre. Para o padre Paulino, alguém sair do sertão, ir para o Amazonas e ser vitorioso, seria como salvar uma alma.

6 Comprometido com o projeto, Linhares e família, foram para a capital, de onde sairia o navio para o Amazonas. À noite a família se reuniu no porto do Mucuripe, próximo à área de embarque, onde aguardariam o dia da partida. Para as crianças, tudo era novidade; o cais, o mar, as jangadas, as garças bailando sobre o mar, o marulho da água no casco do navio, o plangente apito das embarcações, o movimento das pessoas conduzindo malas de viagem, carregadores com sacas de trigo na cabeça ou parados, observando o movimento no cais, contemplando o histórico farol do Mucuripe, e as dunas de areia enfeitando a colina. Linhares observava as ondas do mar quebrando na areia e jangadas se afastando do continente rumo ao mar  para pescar.

7 Augusta pouco observava o mivimento no porto, por estar conduzindo os filhos, e em silêncio com um terço na mão falava com Nossa Senhora da Conceição, pedindo guarnição para serem vitoriosos. Após, longa e triste espera, Linhares embarcou com a família num navio do Loíde brasileiro, cujo destino era chegar à Manicoré, um distante lugar no sul do Estado do Amazonas, que havia sido indicado por Bezerra, afirmando ser uma região de terra boa para plantar. Adiantando que o Governo distribuía terra para quem quisesse plantar e criar animais. Linhares nem imaginava a luta que travaria nessa nova caminhada, seria uma grande aventura de sangrenta luta, perdas e imensas vitórias, até penetrar no grandioso Continente Verde, a maior fauna e flora do Planeta.

“Não perca o próximo IV capítulo de aventuras, chegando ao continente verde.”
Antonio de Albuquerque
Enviado por Antonio de Albuquerque em 23/10/2020
Alterado em 27/10/2020
Copyright © 2020. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.